domingo, 27 de dezembro de 2009

RESSACA DE NATAL


Ecos reticentes de um 26 de dezembro.

*Por Andréia de Oliveira


Normalmente todo final de festa é acompanhando daquela sensação de vazio estonteante provocada pela ânsia do exagero da noite anterior acompanhada pela angustiante certeza do nada do dia anterior. Com o natal não poderia ser diferente e assim em pleno dia 26 de dezembro quando todos os presentes já foram embalados e desembalados, restam-nos as trocas como o abrigo desesperado dos refugos da generosidade que perecem lentamente nos refrigeradores. Há muito pouco a consumir ainda do saco da solidariedade do natal até que os preparativos do reveillon triunfem absolutos como a mais nova droga anestesiante da mórbida realidade, onde os sonhos renovam-se superficialmente a cada contagem arbitrária do tempo .

Assim a quase sempre radiante Salvador, a capital da Alegria, acordou cinzenta e mal humorada nesse dia, escondendo-se a todo custo do sol entusiasta dos dias anteriores. Mas ainda, resta-nos, as promessas de um verão promissor, quem sabe, patrocinado por construções megalomaníacas, como o projeto da Construção da Ponte que ligaria Salvador a Ilha de Itaparica orçada em R$ 2 bilhões . * Essas e outras maravilhosas visões do paraíso terrestre estarão presentes em nosso cotidiano em um 2010 de eleições que ofuscaram às nossas vistas com as inúmeras ofertas de felicidade suprema.

É justamente essa expectativa de “melhor dos mundos” que esteve ausente nesse ano e tornar-se tão evidente, nesse momento, a uma semana do desfecho mal sucedido de uma conferência mundial sobre clima que pretendia supostamente salvar o planeta dos danos do superaquecimento global e agora é manchete esquecida, certamente apenas lembrada em matérias de retrospectivas anuais dos telejornais. Enquanto isso, a mãe Terra demonstra sinais de intenso cansaço e desconforto, proliferando pelos quatro cantos do planeta os extremos de seu prezar e dessa maneira entre o rigoroso inverno do Norte e as tempestades torrenciais do Sul, jazemos inertes. E talvez por isso mesmo não sem razão , cinco anos passados no tsunami que matou em torno de 220.000 mil pessoas na região do Sul da Ásia e Leste da África , um novo terremoto de menor intensidade assola a Indonésia, como um tímido aviso de alerta.

Contudo em um contexto onde nem quase tudo pode ser apocalíptico ou catastrófico , voltemos a essa nossa realidade de expectativas razoáveis que se desenham com o final de mais um ano. Valem as mesmas simpatias, os mesmos rituais, as mesmas comemorações, as mesmas festas, as mesmas companhias, as mesmas roupas brancas de sempre para atrairmos a sorte? Não se sabe, ao certo. O fato é que para boa parte de nós, o dia 01 de janeiro apenas sucederá o dia 31 de dezembro no nosso débil calendário do tempo e daí então ficaremos de novo com aquele mesmo gosto de ressaca do dia 26 .



* Confiram a matéria do Jornal da Metrópole sobre a construção da Ponte Salvador - Itaparica do dia 25 de dezembro de 2009.
FOTO: GOOGLE

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