A escritora baiana, economista de formação, pós-graduada em Metodologia do Ensino e Docência Superior, e que também já desempenhou diversas funções nas áreas financeira e empresarial, Andréia de Oliveira, entrevista Marcus Baby, artista plástico e poeta , um dos participantes do livro "Poemas de Mil Compassos",da Coleção Literatura Clandestina. Marcus, uma “figuraça” da web, que em 2005, começou a trabalhar em silêncio na sua primeira custom doll para poder, em 2008, ser “redescoberto” pela mídia digital, impressa televisiva. Hoje, com uma super coleção de bonecos customizados, acabou virando o “Gepeto dos tempos modernos”, onde conseguiu transformar esta erudita arte em algo deliciosamente popular. Artista dinâmico e versátil, nascido sob o signo de sagitário, incorpora o mito do lendário centauro,disparando suas flechas, nesta interessante entrevista, concedida em agosto de 2009.
Andréia de Oliveira – Oi Marcus, prazer em falar com você. Fiquei muito encantada com seu trabalho. Incrível a sua capacidade de transcender a padronização da contemporaneidade, realizando verdadeiras obras de artes com essas bonecas.
Marcus Baby – Eu é que me sinto honrado de ser "sabatinado" por você e de também fazer parte desse lindo projeto que é o "Poemas de Mil Compassos". Bom, vamos lá: Eu sempre fui o típico colecionador desde criança e adorava juntar cacarecos do tipo figurinhas, gibis, canetas, discos, CDs, fitas de VHS... Aí um belo dia assistindo a um programa de entrevistas da MTV com roqueiros em suas próprias casas (não me recordo se era o Frejat do Barão Vermelho ou o DJ Memê), vi o apresentador mostrar um dos cômodos do lugar REPLETO de BONECOS em prateleiras que tomavam todo o ambiente, tudo comprado durante suas viagens mundo a fora ou ganhos de presente. Cara, eu simplesmente pirei, enlouqueci, achei a coisa mais linda do mundo... Resolvi nesse dia que faria uma coleção similar a dele, até me deparar com o primeiro empecilho: no Brasil não existia esses bonecos para vender, quando tinham eram absurdamente caros, e dificilmente encontraria os meus ídolos, dignos de ornamentarem A MINHA estante! Meses depois, após muitas pesquisas na internet e visitas a colecionadores, descobri a arte dos CUSTOM DOLLS OOAK ("bonecos customizados One Of A Kind – “um único de cada” ), e já no ano de 2005, cheio de coragem e boa vontade, pedi e ganhei de um amigo meu dois bonecos (uma Barbie e um Ken) para customizá-los devagarinho no casal Baby Consuelo e Pepeu Gomes. Fui então aprendendo com meus erros, aprimorando técnicas, e sempre adquirindo outro novo boneco para criar um novo ídolo, ou - muito importante frizar - construindo determinado artista que funcionaria em determinado boneco (pois são eles que "pedem" para se transformarem nas celebridades que estão afim). Ainda não caiu em minhas mãos um Ken ideal para ser o Will Smith - que eu amo!
Andréia de Oliveira – Você acredita que a incorporação de elementos da cultura pop a ofícios manuais milenares, alguns esquecidos nessa era da mecanização, seja o único caminho para o resgate dessas artes?
Marcus Baby – Eu sou totalmente a favor da cultura pop, da modernidade e de todas as formas existentes que tragam a tona algo adormecido. Se for necessário utilizarmos sons, imagens, adaptações para que a literatura (ou o que quer que seja) volte a ser algo prazerosos e importantes, que venham com força todas as Rede Globos e MTVs da vida! O que seria hoje de tanta arte se não fosse essas reinvenções pasteurizadas e muitas vezes distorcidas? Isso só força a galera a pesquisar se aquilo É ou NÃO É o que está sendo divulgado! Quer um exemplo maior do que a moda de "Maysa" no início desse ano devido à mini-série global do Jayme Monjardim? Eu mesmo vi um gari semi-analfabeto cantando todas as suas músicas e perguntando quando seria o show dela na nossa cidade... Trágico se não fosse cômico, mas a meta foi cumprida: uma nova geração "descobriu" algo muito bom que estava esquecido em algum lugar do underground. E sumiria ali.
Andréia de Oliveira – Em se tratando de cultura de uma maneira geral, digo mais, especificamente da literatura, desprezada pelo grande público , carente de incentivos estatais. Você acredita que a cultura pop, a partir do momento que prima pela forma, pela imagem, pela linguagem dinâmica seja uma grande desagregadora da literatura?
Marcus Baby – Acho que existem meios de promover a literatura se utilizando, por exemplo, da TV. Livros que ficam mofando nas livrarias passam a vender horrores quando entram em horário nobre após a novela das oito, como aconteceu há pouco tempo com a adaptação de "Capitu", ou agora, com a gostosa "Decamerão". Eu mesmo descobri a obra de Monteiro Lobato graças ao "Sítio do Pica Pau Amarelo" que passava na televisão diariamente todas as tardes na minha infância. É muito gostoso ver a imagem da narrativa e esse meio instiga os curiosos a irem mais a fundo, procurar mais sobre, pesquisar, buscar... Soube a pouco tempo que a MTV está negociando com os Novos Baianos um "Acústico" com direito a CD e DVD. Já pensou que maravilha? Faço uma aposta com quem duvidar se em alguns dias após a exibição do programa, não vai ter uma mulecada de 12, 14 anos cantando a letra completa de "Preta Pretinha" ou "Brasil Pandeiro"...Andréia de Oliveira – Creio que essa releitura televisiva das obras consagradas de grandes nomes da literatura é positiva desde que estimulem a leitura dos originais, senão toda luta em prol da difusão da literatura fica sem sentido. Concorda?
Marcus Baby – Desde que se coloque a frase “inspirado ou adaptado da obra de fulano de tal”, sinceramente não vejo problema algum. A parcela interessada de pessoas que vão procurar a fonte escrita após assistir a versão da TV, com certeza saberá distinguir o “pingado” do Capuccino. E o restante, infelizmente, não tem mais jeito. Leitura é um prazer que se adquire ainda pirralho no jardim de infância. Eu, por exemplo, conheço um adolescente que virou tiete dos textos de Chico Buarque de Holanda após escutar “Deus Lhe Pague” interpretada em versão heavy-metal pela roqueira Pitty! Isso não é o máximo? Coisas desse tipo me certificam de que Carlos Drummond de Andrade, caso ainda fosse vivo, seria hoje o melhor amigo do Gabriel O Pensador!
Andréia de Oliveira – Ainda em se falando da reprodução televisiva de obras da literatura, você não concorda, que haveria um risco de distorção das ideias originais do autor, ou ainda a anulação da função reflexiva do livro? Digo isso porque a leitura é uma atividade cognitiva que estimula a reflexão, a análise, o pensamento, o dialogo consigo mesmo, já a linguagem televisiva pela própria dinâmica e apelo visual não favorece a construção do pensamento crítico, visto que sua função na maioria das vezes é o puro entretenimento.
Marcus Baby – Olha Andréia, essa é a atual e infeliz realidade do universo pop, que sucumbiu por inteiro nas facilidades tecnológicas e na pirataria cultural: estamos vivendo a era da urgência! Pelo que vejo (e acompanho o makin-of), não tem data para passar. Eu sinceramente acho que o artista, independente do seu rótulo, deve ampliar seus horizontes e fazer aquilo que todo brasileiro já sabe de berço: não desistir nunca. E já que é necessário sobreviver em meio a tanto lixo não-reciclável, temos mais é obrigação de ficarmos atentos aos imprescindíveis 15 minutos de fama, agarrá-los com unhas e dentes na menor chance! Se você for realmente bom naquilo que faz e esperto o suficiente para usufruir dos recursos disponíveis do mercado atual, basta apenas aproveitar uma única oportunidade para que sua arte seja reconhecida de forma gradativa e no sentido crescente, sem a necessidade de inconseqüentes explosões da moda. Afinal, nem todo mundo tem vocação para ser um eterno ex-big brother, né? Graças a Deus (risos).
Andréia de Oliveira – Trazendo o foco agora para os livros, li na sua crônica do blog "Poemas de Mil Compassos "que você é um leitor assíduo dos mais diversos temas. Qual seria seu tema preferido? Quais autores você lê atualmente? Você fez referências também aos livros de auto-ajuda? É uma leitura que realmente lhe agrada? Esse não seria um segmento comercial de qualidade duvidosa?
Marcus Baby – Devido ao meu momento atual, ando completamente apaixonado por biografias, livros fotográficos (amo) e aquelas brochuras de tema único e generosamente ilustradas chamadas de “Almanaque” que voltou estiloso da década de 70, agora como moda de vanguarda. Estou lendo o indefectível Kid Vinil (“Almanaque do Rock”), e uma coleção de entrevistas feitas pelo Zeca Camargo (“De A-ha a U2”). Encerrei há pouco tempo uma biografia não autorizada da Lucy O’Brien (“Madonna 50 Anos”) e estou para comprar o último do Moraes Moreira (“A História Dos Novos Baianos E Outros Versos”). Esta semana descobri um livro fotográfico maravilhoso sobre Marilyn Monroe, “Images Of Marilyn” e um outro do gênero chamado “Mythology” (com desenhos do Alex Ross para a DC Comics) num sebo próximo de onde almoço, lindos, tamanho gigante e capa dura, que não sossegarei enquanto não comprar os dois. Nas férias, pretendo ler Stephenie Meyer e sua saga “Crepúsculo”, “Lua Nova”, “Eclipse” e “Amanhecer”, pois o meu dia de 24 horas é curto para quem só dorme quatro horas por noite, e eu prefiro saborear livros de romance ou ficção lentamente como quem toma vinho. E não tenho predileção específica por determinado tema. Apenas sigo sugestões e verifico se gosto ou não. Li sim o Lair Ribeiro quando adolescente, ganhei um de seus livrinhos ensinando a ganhar dinheiro e achava tão interessante na época quanto hoje acho “O Segredo” da Rhonda Byrne. O que me interessa é preencher a minha necessidade de informação, sem vínculos com guetos ou rótulos. Só posso opinar depois que conheço o conteúdo. Sou pop e o que vier eu traço.
Andréia de Oliveira – E em relação à poesia. Como começou a sua experiência com a poesia? Você acredita ser essa arte de difícil acesso ao público? Qual o grande responsavel pelos desinteresse sobretudo nas escolas e faculdades pela poesia? Seria essa arte uma expressão muito lírica para o objetivismo dos dias atuais?
Marcus Baby – Para mim, a poesia é a necessidade vital de um seleto grupo de pessoas sensitivas e não há como forçar a barra para se gostar dessa forma de arte, porque o amor aos versos vem do DNA de cada um. Não tem como apontar culpados pelo desinteresse por algo que surge de dentro pra fora, que já existe nas entranhas de quem realmente aprecia. É íntimo. Eu descobri que gostava de poesia naquela inominável fase da vida em que a gente não é adulto suficiente para tomar atitudes infantis e nem é criança o suficiente para tomar atitudes adultas. Sofria por me achar diferente das pessoas a minha volta, e meu único refúgio era escrever num caderno rimas desordenadas tal como o sentimento que rasgava o meu coração. Aquilo era minha válvula de escape, uma catarse, até o dia em que percebi ser mais sensível que todo mundo e precisava me abster de algo paradoxal entre o onírico e o concreto. Foi aí que conheci os meus gênios da arte como Vinícius de Moraes, Florbela Espanca, Henry David Thoreau, Guilherme Isnard, Cazuza, Emily Dickinson, Arnaldo Antunes, Zédantas, Walt Whitman, Fausto Fawcett, Mário Quintana, Paulo Leminski, Waly Salomão e um monte de gente que amo de paixão. Porém, já homem feito, resolvi fechar para visitação esse meu lado poético e me dediquei – entre outras formas de expressão artística – a escrever crônicas urbanas para meus blogs e algumas coisas de encomenda para sites de teor GLBTS, ou, para qualquer um que quisesse ter um texto by Marcus Baby. Até chegar a conclusão de que internet é a “terra de ninguém” onde virou, mexeu, encontro muuuuita coisa minha solta na web copiada descaradamente sem os meus créditos... Mas tem nada não, Deus tá vendo (risos).
Andréia de Oliveira – Por fim, gostaria que falasse um pouco sobre as impressões subjetivas presentes em sua obra. Existe alguma mensagem específica que pretende passar ao público através de seus bonecos?
Marcus Baby – Nem em meus mais felizes sonhos poderia um dia imaginar que seria sinônimo de determinada expressão artística no país ou de ser reverenciado por meus próprios ídolos que se transformaram em fãs da minha arte, e tudo isso num espaço de tempo absurdamente curto. Como nunca e em momento algum previ o que está acontecendo agora nesse momento comigo, continuo agindo como se tudo ainda fosse aquele meu tranquilo hobby despretensioso que só eu e as pessoas mais chegadas, tinham acesso livre para admirar. A minha intenção inconsciente é a do auto desafio que me proponho interruptamente até o momento em que concluo mais um projeto imaginário que ferve dentro de minha cabeça. Sou fascinado pela imagem tridimensional, amo o universo pop e todos os seus personagens únicos e reais, adoro mixar elementos díspares como o novo e o velho, o feio e o bonito, o bem e o mal, o ying e o yang... E no final das contas, estou curtindo a idéia de ser o “Gepeto dos tempos modernos”, um título fashion-filosófico para quem literalmente brinca de ser Deus e dá a vida a algo que até então não existe... Já a minha intenção consciente, aquela que deposito em forma de mensagem subliminar em cada pequeno detalhe de cada “filhote” que ponho no mundo, vem de uma frase simples, beirando ao clichê batido, que até adoto como um mantra, sigo e divulgo com maior prazer: “eu quero, eu posso, eu consigo”. Mais verdadeiro não há e eu sou prova viva disso. Em suma, tudo - mas tudo mesmo - é possível.
Andréia de Oliveira – Gostaria de agradecer a oportunidade de conversar com você e desejar sucessos para você.
Marcus Baby – Eu é que agradeço a todos vocês, Elenilson (pela coragem e brilhantismo), Andréia de Oliveira (pela sagacidade e inteligência) e a todos aqueles que dispensaram seu precioso tempo em me pesquisar, analisar, dissecar... e enfim, saber algo mais denso sobre minha pessoa e minha arte, além do que já existe por aí nos Googles da vida! Como diria os "gurús" do Planet Hemp, "eu continuo queimando tudo até a última ponta"... Valeu, obrigado e muita luz!
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